A L E G R I A
Poço de Jacó 20114
Entrar em contato com a própria alegria cura o corpo e a alma. A noção de alegria é expressão do ser, expressão de vida intensa e criatividade. Não temos alegria por esforço, mas podemos tentar viver de modo intenso e criativo. Assim a alegria virá como expressão de vivacidade e criatividade.
A felicidade é uma paixão construtora e salutar, compaixão repleta de vida e da qual brotam energias e prazer de viver.
Alegria é expressão de elevação de vida autêntica. O desenvolvimento e a realização da natureza humana são pressupostos da alegria. Não se trata de manter permanente sorriso nos lábios, mas de elevar a vida, de permitir sua vivacidade, de ser criativa e estar em harmonia comigo mesma, desdobrar dons e faculdades.
A alegria sempre tem a ver com amor produtivo, baseado na atenção mútua, não na dependência.
Quando descubro algo novo, isso libera alegria. Alegria é expressão de atividade, amor, abertura. Fortalece a disposição positiva. Desejar a atenção dos outros mostra carência. Enquanto que alegrar-se com as pequenas coisas do cotidiano é sinal de vida abundante. Quem negligencia as pequenas alegrias sente-se cansado, sonolento, tenso. Mas se a pessoa se dispõe para o belo pode, por esse meio, descobrir sua espiritualidade intrínseca, a harmonia consigo e com o mundo, mas sobretudo com Deus mesmo. Pode transformar uma experiência de carência numa experiência de plenitude. Como as crianças que logo descobrem um caminho para a vivacidade e a alegria.
Agua corrente é símbolo de vida. Deus é vida, vida corrente, amor que flui. Se estiver precisando fazer muito esforço, gastar muita energia para cumprir um programa espiritual é sinal de que se impôs um caminho espiritual inadequado. A marca da alegria é como uma pegada para a espiritualidade adequada, que cresce e leva para Deus de modo tão certo como quando em criança, levou à vida.
Deus, de modo inesperado e sem motivos, organiza o caótico em nós, transforma o fado e o tormento em alegria e jovialidade. Olhar o mundo com os olhos da fé traz alegria. O mosteiro não é feito para resolver os problemas, mas para louvar a Deus a partir dos problemas. O louvor faz contato com a alegria interior. Sem fechar os olhos para os problemas, mas passando a não se fixar neles. Olhar para Deus a partir das dificuldades. O humor assim se transforma e a alegria flui.
Nosso mundo envolto no fazer se distancia da condição de festa, da capacidade de celebrar a simplicidade da vida e que pode conduzir à sua plenitude.
Precisamos do descanso, que nosso mundo frenético não valoriza devidamente; ele leva à alegria, à contemplação, ao regozijo.
Alegria nos impulsiona a servir à vida e despertar a vida em outras pessoas. Assim Zaqueu desceu depressa e acolheu Jesus com alegria. Para conquistar alegria devemos descer de nosso posto de observação, de julgamento, de distanciamento. Com alegria podemos acolher aquele que nos leva pela mão e nos envolve com seu olhar amoroso. Quando Zaqueu se envolve por inteiro no momento, quando acolhe aquele que o aceita, cresce nele a alegria. Entrega-se e se envolve por inteiro no acontecimento. Essas são condições para que a alegria nos preencha cada vez mais.
Alegria – vida, movimento, fluidez, espiritualidade autêntica, criatividade, leveza, graça, prazer, liberdade; sua origem é o compromisso com Deus. Faz parte do cêntuplo prometido. Permanecendo na entrega, na oblação, no domínio de si, traz felicidade; revelação da vida profunda. É fagulha de eternidade. Surpresa que chega como a estrela para os magos (Mt 2,10), seguem obedientes a palavra humana de Herodes, que não os ilumina, mas a docilidade lhes possibilita ver com alegria a estrela que aponta a salvação.
A verdadeira alegria nasce em contexto de pobreza, de carência, de saber-se necessitado. Sl 50: dai-me a alegria de ser salvo.
A ação que flui da alegria não tem o peso do cumprimento de um dever. Não é acompanhada de reclamação, não fica remexendo os sentimentos, mas permite que a vida perpasse o próprio ser. É abrir-se ao Espírito.
Quanto mais aprofundo a relação com Jesus, quanto mais entro no espaço interno do silêncio em que Deus mora em mim, mais participo da alegria que ninguém pode tirar. Mas a vida espiritual não é apenas alegria, é também noite escura. Não sinto alegria o tempo todo, mas ao meditar e entrar no espaço de silêncio, encontro serenidade, caminho, luz, compreensão da realidade. Quanto mais deixo Deus invadir, mais alegria divina me acompanha. Degustar o saber-se filha, no acolhimento incondicional, na turbulência que recorda a sintonia de base, onde fico à vontade com minha interioridade.
Nossa vida tem algo de sobrenatural e é para essa esfera que Deus nos chama. Um pouco de silêncio conduz à uma escuta mais profunda e ali nos aguarda a alegria, suave e sólida.
Prólogo de S Bento – quem quer a vida e deseja ver dias felizes? Busque seu espaço novo, outro ângulo de visão, não tenha medo da vida.
Onde Deus está há alegria – Sara e Abraão
Abraão caiu com o rosto por terra e começou a rir, pensando: "Será que um homem com cem anos vai ter um filho, e Sara, que tem noventa anos, vai dar à luz?" Gn 17,17
Sara riu por dentro, pensando: "Agora que sou velha vou provar o prazer, e com um marido tão velho?" Gn 18,12. Nasceu Isaac – sorriso de Deus. Sara ri por descrença. Deus sorri por benevolência. Assim nasce Isaac –sorriso de Deus. Deus deu-me de que rir e todos que souberem poderão sorrir comigo. Gn 21,6
Deus está em mim, não preciso ser sempre compreendida, reconhecida, aplaudida. Não ser compreendida pode passar a não me paralisar, mas me fazer retornar à alegria interna. Como correnteza que arrasta o cascalho e contorna as rochas, a alegria também é uma torrente viva, que traz energia e não se deixa deter pelos obstáculos.
Sobre Sodoma e Gomorra, Abraão vai negociando com Deus – amor e humor de Deus.
A ascese deve levar à alegria. Na Quaresma ofereça algo a mais e na alegria do desejo espiritual, espere a santa Páscoa (Reg. S Bento 49,7).
Na vida ora ganho, ora perco. Se me uno à alegria posso trabalhar mais despreocupadamente. Eles sacudiram contra eles o pó dos seus pés, e foram a Icônio. Os discípulos, por sua vez, estavam cheios de alegria e do Espírito Santo. At 113,52. Para São Lucas a alegria é sinal de que o Espírito Santo está no ser humano.
A pérola escondida – encontro um bem precioso e me lanço a ele. De minha parte, disponho-me a agradar somente a Deus, sabendo que o ardor da fé renova minha alegria e quanto mais me abandono em Deus, mais alegria gratuita me acompanha. Quando não se busca a Deus o bastante o fardo fica por demais pesado suportar. A proximidade de Deus traz um fervor intenso e calmo e posso correr com coração dilatado nos caminhos do Senhor (Prólogo de S Bento, 50). A expectativa do Bem já nos oferece a alegria interior pelo vislumbre, ainda que longínquo, da pérola escondida.
Há uma alegria calma em mim, mas alegria procura comunicar-se, procura companhia, comunidade. Quem tem olhar para a beleza da criação encontra sempre motivos para se alegrar.
Temos o convite e o dever da alegria. Nossa cultura vive em desencontro com a alegria. Mas o diagnóstico do mundo que nos rodeia e nos envolve não pode silenciar a mensagem evangélica da alegria.
Cada um tem um lugar seu para experienciar Deus de maneira mais intensa, de encontrar Seu sorriso. Esse espaço, esse abandono abre caminho para deixar passar a depressão e fortalecer o corpo.
A grande alegria é encontrar a sabedoria que Deus nos concede. Então brota a leveza de alma, a harmonia do ser, a aprovação do Senhor.
Alegria e amor num só passo. Pela oração posso fazer esse caminho conjugado e a alegria estará ao lado de Deus. Alegria é orvalho de vida eterna, é vida divinizada.
Jesus, que nos revela o Pai nos a oportunidade de viver a alegria divina. Ela indica o quanto estou vivendo do espiritual. E essa alegria ninguém poderá tirar. Ela une Deus à criação. Essa alegria não custa nada. Simplesmente amanheço e começo com louvor meu encontro. Alegria tranquila que leva à festa da Eucaristia e dali transborda para o correr do dia. Logo virá a terra seca, o sol ardente onde essas sementes preciosas vão ser curtidas e provadas. O que restará no final daquela jornada? É mistério! Mas temos sempre outra chance de recomeço no novo dia que desponta.
No sofrimento posso confirmar o amor por Jesus e poder esperar um dia estar com ele no céu. Sofrer com ele dá sentido, comunhão, proteção; o reconhecimento de que é transitória a dor e perene a glória eterna em Deus. Por isso não posso saltar o tempo da tristeza. Sou chamada a suportá-la, a entregá-la ao Senhor: em tuas mãos...
Suportar as dificuldades conduz à alegria de estar a serviço deste Senhor que me põe no caminho estreito, carrega comigo a cruz para que tenha Vida; vai crescendo a capacidade de amar. São Gregório disse a respeito de São Bento: para quem fixa o olhar em Deus, as criaturas ficam pequenas. Posso correr pelo caminho dos mandamentos de deus (Prólogo da RB) e o que tinha começado a fazer com esforço, passo a executar com leveza de alma. Vai mudando minha forma de conceber e conduzir a vida. Continuo com as situações difíceis, desafiantes, até sufocantes, mas tudo supero por causa daquele que me amou e se entregou por mim (Gl 2.20). é assim que meu peso se torna leve. Quando me deixo ser conduzida a alegria vai entrando de mansinho pela porta que eu deixei, no irmão que eu ajudei sem querer devolução.
Quanto mais diminui o amor próprio, mais aumenta o amor a Deus. Ninguém cuida de nós e nos dá tanta alegria quanto Deus mesmo. Quem procura, encontra.
A dor vai dando lugar à bondade, à gentileza; alegria em Deus não é inconveniente. Deixa o coração inteiro, firme. Só podemos ter alegria duradoura quando nos alegramos no Senhor. O desejo da alegria é também um desejo de ter Deus, único capaz de nos dar alegria perfeita e permanente.
Ação de graças pela vida que me é dada. Jesus mostra como viver na serenidade, celebrando a vida, assumindo a dor própria e a dos outros, colocando nas mãos do Pai o espírito de vida, numa entrega incondicional, caminho de fé e abandono – eu quis comer esta ceia com vocês, é o amor além do medo, por causa de sua união íntima com o Pai.
A alegria que a fé nos proporciona é necessária neste mundo para nos dar impulso e ânimo na caminhada; temos alegria pela fé que cultivamos e ela nos proporciona alegria, regozijo. Suavidade, bem-estar por dentro, nos protege do desânimo e da descrença.
Jo 15,11 – estou dizendo tudo isso para que minha alegria esteja em vocês e essa alegria seja plena.
Vamos iniciar o caminho rumo à alegria pascal. Jesus nos oferece a alegria trinitária que tem no Outro, não na posse.
A alegria de crer leva a crer na alegria. jesus se alegra com o anúncio da Boa Nova feito pelos discípulos (Lc 10,21). Deus nos espera que fiquemos no buraco do fracasso, Ele nos criou para sermos felizes. Ele tomou sobre si nossas dores, é preciso que sofra para que a alegria pascal aconteça. Tudo que em nossa vida é preciso passar é tocado pela luz de Deus.
A alegria é crescente quanto maior for a desapropriação de si. Alegria de não reter a vida, mas de abandonar-se a ela e assim poder escutar: entra na alegria do seu Senhor.
A perfeita alegria que São Francisco encontra é a de sofrer sem se abater por causa da esperança da glória, a vossa tristeza se transformará em alegria. suportar já é vencer.
Filho pródigo – tinha registro de felicidade que lhe possibilitou restituir a alegria. diz o Eclesiástico: nos dias de tristeza, lembra dos dias de felicidade. Lembrança boa acalenta e refaz o ânimo, reordena o interior, é o contato harmônico com a experiência de amor, acolhida, aconchego. A alegria vem pelo doar-se
alegria pede festa. Celebrar as festas litúrgicas é como colocar a alegria de Deus em recipientes humanos.
Irmão mais velho – tão ocupado consigo mesmo que não consegue entrar na festa.
Festa supõe união, reunião.
Canto é próprio de festa, de alegria, é expressão de amor. O júbilo, que faz celebrar um jubileu, é um som que o coração produz para dizer o que não se consegue só com palavras.
Irmã Cândida, camiliana de 107 anos, recomenda: sejam atentos e dóceis à vontade de Deus, a única coisa que nos dá alegria plena.
Fontes: A Grün, Reencontrar a própria alegria, Ed Loyola, 2005
C Marmion, Jesus Cristo, ideal do monge
Rev. Beneditina 40, Ed Subiaco
Bliblia Sagrada, Ed Ave Maria